sábado, 21 de fevereiro de 2015

LIÇÕES DE LIDERANÇA - SABER RECONHECER OS EXCESSOS



Uma das maiores lições de liderança que aprendi em minha vida profissional, veio exatamente de um colaborador de minha equipe. O melhor de tudo é que além disso, era e é uma pessoa pela qual tenho muita admiração, apesar de hoje não termos mais contato, muito mais por conta dos caminhos que a vida destina a cada um de nós, do que qualquer outra coisa. Nós começamos juntos nessa empresa, convivemos dentro e fora da mesma e realmente dos dávamos muito bem.

Na época do ocorrido, eu estava como coordenador de processos em uma fábrica do ramo alimentício, trabalhando no turno da noite. Eu gostava do horário, pois conseguia descansar muito bem durante o dia e a noite estava devidamente revigorado para o trabalho. Logo, confesso que estava em uma fase relativamente tranquila, em todos os aspectos, e em paz comigo mesmo.

Porém, uma determinada noite, estava passando pela linha de produção, quando repentinamente ocorreu um vazamento em uma tubulação por onde passava soda cáustica a alta temperatura, utilizada para limpeza e higienização das linhas. Foi um grande susto, mas graças a Deus ninguém se feriu.

Como estava próximo, imediatamente fui verificar o que havia ocorrido. Conversando com o operador da linha (o mesmo colaborador que citei no início do texto), este me explicou que durante a montagem da conexão para limpeza da linha, como tinha o hábito de orientar e incentivar o aprendizado dos auxiliares de produção que trabalhavam com ele, havia permitido que um desses auxiliares, que já tinha um certo tempo de casa e conhecia as rotinas de fabricação, efetuasse a montagem do equipamento para a realização da limpeza. Ao tomar conhecimento disso, fui tomado por uma fúria incontrolável e chamei severamente a atenção dele e todos os presentes. Na verdade, severamente é uma palavra atenuante, frente ao que realmente fiz. Eu praticamente agredi verbalmente a equipe, alegando que por conta de uma irresponsabilidade, poderíamos ter contribuído para um ferimento de extrema gravidade em alguém. Em resumo, destruí a autoestima da equipe.

Bom, retornei a minha sala, acreditando ter cumprido o meu dever e orgulhoso de mim mesmo. Afinal, havia demonstrado toda a minha autoridade perante a equipe e mostrado quem mandava lá.

Passados uns dez a quinze minutos, aquele mesmo operador, o mesmo que tinha minha simpatia, veio até minha sala, se aproximou e falou em tom bem baixo e calmo ao meu ouvido, quase com lágrimas nos olhos:

- Carlos, a gente sabe que houve um erro ali. Mas acho que você não deveria ter falado daquele jeito comigo, na frente de toda a equipe da minha linha. Me senti desrespeitado. Eu tenho tanta admiração e respeito por você, tanto que nem respondi e olha que até com o gerente da fábrica eu bati de frente, diante de todos os colaboradores. Por favor, Carlos... não faça mais isso... por favor...

Pessoal, o que ele disse era verdade. Naquela empresa, a autoridade máxima era o gerente de cada fábrica. E ele realmente havia interpelado nosso gerente com bastante contundência durante uma reunião de apresentação de resultados por parte do mesmo. E outro detalhe importante: este colaborador tinha estabilidade da CIPA. Logo, ele realmente poderia ter me respondido, sem risco de algum tipo de punição mais severa. Mas o detalhe foi esse: ele me tratou com todo o respeito e consideração, exatamente o que faltou de minha parte para com sua equipe.

Assim que ele terminou de falar, quem estava com os olhos marejados era eu. Tomado de vergonha, remorso e decepção comigo mesmo. Respirei fundo então e pedi para que ele reunisse a equipe toda, pois em dez minutos eu iria conversar com todos. Na verdade, esses dez minutos eu pedi para me recompor e tomar coragem, dada a atitude infame que havia tomado.

Fui então conversar com a equipe. Estavam todos reunidos e comecei a falar. Primeiramente me desculpei pela minha postura, mas expliquei que não me desculpava por ter-lhes chamado a atenção por conta da falha de se colocar um colaborador que não era formalmente preparado, para executar uma atividade com tamanho risco agregado. Fiz questão de frisar que minhas desculpas deviam-se tão somente a minha postura. Afirmei que estava muito envergonhado do modo como os abordei e assumi publicamente que naquele momento, o momento em que me excedi nas palavras, estava tomado pela sensação de poder, de mandar, de ser o dono da situação. Orientei a equipe quanto ao modo certo de se proceder e mais uma vez me desculpei. Finalizada a reunião, eu e a equipe nos cumprimentamos mutuamente, em uma atitude de perdão e resignação e retornamos as nossas atividades.

Depois de alguns minutos, procurei aquele operador e o agradeci profundamente, pela lição que havia me dado, uma lição que carrego até hoje. Aprendi que os erros e falhas devem sim ser abordados e corrigidos, porém sem demonstração gratuita de poder e austeridade. Na verdade, o que eu buscava naquele momento de contundência ao esbravejar com os colaboradores, era nada mais nada menos do que uma auto afirmação.

Um verdadeiro líder corrige orientando e não agredindo. Mas, sabendo que somos humanos e passíveis de falhas, caso nos encontremos em uma situação dessas, em que agredimos e humilhamos membros de nossa equipe, é sábio, prudente e muito honroso, saber reconhecer o excesso e pedir desculpas. Digo isso com propriedade, pois após esse fato, e isso me emociona até hoje, todos os membros daquela equipe, até o dia em que saí daquela empresa, adotaram uma fidelização para comigo sem igual. Trabalhamos juntos em horários diferentes, em cargos diferentes, mas posso dizer que, em relação a eles, nunca precisei "mandar", bastava pedir e tudo se resolvia rápido. E isso sem contar as vezes em que simplesmente ao me verem passando pela fábrica, corriam em minha direção e perguntavam se precisava de alguma coisa. Daquela que por alguns minutos foi uma situação lamentavelmente adversa, brotou um nível fantástico de fidelidade.

Amigos, no ambiente profissional, uma boa postura de liderança, respeitosa com os demais, é capaz de milagres, podem acreditar.

2 comentários:

  1. Carlos, o melhor ensinamento que temos é a convivência. A cada dia temos algo mais a aprender. Todos nós erramos e os erros quando são proveitosos, nos ensinam muito. Confesso que me orgulho de muitas coisas que fiz, e que tem coisas que eu fiz que jamais faria novamente. A cada dia que vivemos, o que perdemos no físico, ganhamos na mente.

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  2. Boa tarde, Ivan. É com muito orgulho e alegria que recebo seu comentário e saiba que foi o primeiro.
    Realmente, somos muito falhos. Temos sempre que buscar a evolução e constante melhoria. Mas se cairmos em erro novamente, é necessário hombridade para reconhecer e assumir as faltas cometidas.
    Muito obrigado e forte abraço!

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