O fato que relatarei hoje, se passou comigo em 2012. Eu era
coordenador de uma equipe e vivenciava uma condição desagradável,
onde por conta de uma decisão equivocada tomada um ano antes, nasceu
um clima que se tornou insustentável em meu departamento.
Bom,
vamos lá. Uns 4 meses após minha chegada nessa empresa onde se
desenrolaram os fatos, eu ainda estava estruturando minha equipe, de
modo a torná-la o mais eficiente possível. Então, em conversa com
o supervisor de produção, o mesmo me recomendou um colaborador de
sua equipe, um jovem de uns 20 anos na época (vamos chamá-lo
ficticiamente de João), o qual afirmava ser de extrema competência
e que, segundo ele, encaixaria perfeitamente nas minhas propostas
profissionais para o time.
Ouvindo
isso deste supervisor, por quem tinha grande respeito e admiração,
abracei a idéia e dei andamento ao processo de inclusão de João
em minha equipe. Isso foi até fácil, pois não haveria necessidade
de criação de nova vaga nem função, conforme acordado com a
gerência da empresa e RH.
E
assim foi. João foi incluso no time e fomos passando aos poucos as
atividades que o mesmo executaria e o que tínhamos de expectativa
dele. Porém, em determinado momento, por uma ordem expressa do dono
da empresa, tudo o que havíamos definido como estratégia foi por
água abaixo. Uma outra pessoa de meu time (vamos chamar
ficticiamente de Maria) teria que ter outro foco e por conta disso, a
função de João ficou um tanto quanto sem sentido. Na verdade, ele
até poderia fazer o que Maria deixou de fazer, por determinação do
dono da empresa, porém Maria ficou profundamente incomodada com o
fato, porque havia sido contratada para aquela função, sob minha
promessa de executar aquelas atividades, onde eu acreditava estar
alinhado com a alta direção da empresa.
Vejam
só como uma decisão mal calculada e arbitrária promove uma
verdadeira ruptura em uma equipe, que estava se organizando tão bem
até aquele momento. A situação ficou da seguinte forma: Maria, que
foi afastada da função ficou extremamente transtornada, pois se
sentiu traída, e João, que era então seu auxiliar, e que poderia
assumir as funções então vagas, ficou perdido sem saber o que
fazer, porque Maria não admitia que ele assumisse aquelas que eram
então suas atividades. Situação extremamente crítica e que durou
quase um ano.
Eu
confesso que fiquei sem saber o que fazer, pois não concordava com a
definição da alta direção, a qual era contrária ao que havia
sido acordado anteriormente. Havia contratado Maria para uma função,
conforme minha própria promessa, colocando João como seu auxiliar,
e agora Maria deveria fazer outra atividade, a qual ela havia me dito
na entrevista que não tinha o perfil. Com isso, não admitia de modo
algum que João ficasse com suas atividades anteriores.
O
resumo disso foi o seguinte: Maria não conseguia render em suas
novas atividades, pois ainda insistia em executar suas atividades
anteriores, enquanto João ficava praticamente sem ter o que fazer,
pois Maria recusava sua ajuda. Eu poderia terminar com isso
facilmente, porém, como disse anteriormente, por abominar a decisão
contraditória da diretoria da empresa, optei por levar a situação
até onde conseguisse.
Pessoal,
aí o tempo foi passando e as coisas piorando mais e mais. Maria a
cada dia recebendo mais e mais críticas da Direção da empresa e
João praticamente sem ter o que fazer. Acreditem, chegava ao ponto
dele ficar sentado boa parte do dia, de frente para mim, na minha
mesa, jogando no celular. Eventualmente, quando me desvencilhava
rapidamente dos meus inúmeros afazeres, pedia alguma coisa para ele
fazer, algo simples, tipo levar um documento a algum setor ou tirar
alguma cópia. Acabei fazendo João de office boy, muito aquém da
importância das atividades iniciais para as quais havia solicitado
sua inclusão na equipe.
E
foram-se vários meses, com Maria mais e mais insatisfeita, até por
conta das cobranças da diretoria, João cada vez mais “parado” e
o clima na equipe começou a pesar. Os demais começaram a ficar
indignados da postura de João, que realmente nada fazia durante todo
o dia, enquanto eles trabalhavam árduamente. É claro que João
poderia ser mais proativo, mas eu me culpava por não orientá-lo,
pois realmente também havia ficado sem saber o que fazer diante de
todo aquele embrólio surreal.
Minha
equipe me chamou algumas vezes para conversar sobre João e nós
dialogávamos sobre o que fazer. Por conta disso, conversei com João
umas 3 vezes, reorientando-o, solicitando que ele atendesse as
solicitações dos demais e, além disso, buscasse outras atividades
quando não houvesse o que fazer. Mas havia um problema crítico:
João havia se desmotivado muito, por conta de tudo o que acontecera.
Bom,
ao longo de alguns meses de várias tentativas de conversas e
orientações, e realmente surgiram muitas atividades importantes,
onde João poderia certamente contribuir grandemente, João não
apresentava reação. Até que minha equipe se reuniu comigo e me
cobrou fortemente por uma definição. Nesse momento entendi que não
havia mais o que fazer. O que começou com uma decisão extremamente
absurda da diretoria da empresa, que passou por um período de
tentativas e reflexões de minha parte, assumindo uma dolorosa
responsabilidade quanto a João, deveria ser finalizada
emergencialmente. Entendi naquele momento, que além da falha da
diretoria, houve também uma falha minha de gestão, mas que havia
conseguido levemente recuperar nos feedbacks que apliquei em João
tentando trazê-lo de volta a realidade. Também entendi que, mesmo
frente aquela situação adversa, nada justificava a postura de João
em se entregar e simplesmente abandonar a vontade de trabalhar. A
demissão era inevitável.
Dessa
forma, solicitei ao RH todos os trâmites e logo chegou o dia. Chamei
João para uma conversa e comuniquei a decisão, detalhando todos os
motivos, me desculpando pelos equívocos e, principalmente,
explicando minuciosamente os pontos em que ele poderia ter
contribuído para mudar aquele final de história. Foi um feedback
longo e bem detalhista. Para minha surpresa, após tudo o que disse,
esperando receber de volta duras críticas, do tipo “você é um
péssimo gestor”, “você não sabe enfrentar os superiores e
aceita todas as imposições”, João me olhou calmamente e disse:
“Olha, eu fico muito grato pela oportunidade que você me deu e
peço desculpas por não ter aproveitado, causando tantos problemas
pra você”. Pessoal, é difícil definir minha sensação ao ouvir
aquelas palavras. Era uma mistura de frustração pelo ato de demitir
com o sentimento de dever cumprido.
Amigos,
eu faço parte da escola de liderança que abomina a demissão como o
primeiro ato na escala de correção de postura. Na verdade, a
demissão é um atestado de incompetência dos gestores que não
conseguem orientar seus times. Por isso, entendo que deva ser a
última carta a ser colocada na mesa. Logo, nesse caso, entendi que
realmente, apesar de ter falhado em algumas etapas, tentei até o
limite manter João na equipe e resgatá-lo em motivação.
Infelizmente não foi possível e, para não perder o resto da
equipe, acabei decidindo, nesse caso, por sua demissão.
Concluindo,
suas palavras me aliviaram o coração, pois ficou claro que ele
entendeu todo o que aconteceu e todos os esforços feitos para se
contornar a situação. Hoje, ele faz parte de minha rede no Facebook
e parece que está muito feliz com as atividades que começou a
desenvolver após sua saída daquela empresa. Fica claro aqui o
seguinte: a demissão deve sim ser o último e derradeiro recurso, já
bem no limite, para se resolver algum problema dentro da equipe.
Porém, caso venha a ocorrer, esse ato deve ser respeitoso e muito
bem esclarecido, pois é um momento de fragilidade do colaborador, o
qual merece ser respeitado desde o momento em que entra na empresa,
até a hora de sua saída. Fica aqui a reflexão.